Oito entidades que registraram um índice de 100% de associados entrevistados pela Controladoria Geral da União (CGU) que denunciaram descontos indevidos não foram processados pela Advocacia Geral da União (AGU).
A CGU fez 1.273 entrevistas, entre abril e julho de 2024, com pessoas que moram nas 27 unidades da federação e que tiveram o desconto associativo. Apenas 31 confirmaram ter autorizado os descontos.
No caso de oito entidades, todas as pessoas que falaram com auditores negaram ter autorizado os descontos. A lista inclui associações ligadas a investigados no esquema de descontos fraudulentos do INSS e até com assinatura falsa na adesão — todas estão fora do rol de alvos da ação de R$ 2,56 bilhões em bloqueios, movida pela AGU.
Uma delas é a União dos Servidores Públicos do Brasil (UNSBRAS). Essa empresa é de três associações ligadas Maurício Camisotti, empresário suspeito de se beneficiar com R$ 43 milhões e pagar, por meio de suas entidades, pelo menos R$ 12 milhões a Antonio Carlos Camilo Antunes, lobista conhecido como “Careca do INSS”.
No caso da UNSBRAS, todas as 72 pessoas entrevistadas disseram que a entidade fez cobranças indevidas.
Já a Rede Ibero-Americana de Associações de Idosos do Brasil (RIAAM), por sua vez, está entre casos em que o Metrópoles mostrou de fraudes em assinaturas e abordagens predatórias ficaram comprovadas pela Justiça em duras sentenças que aplicam às associações multas por danos morais.
A vítima foi Emília Rodrigues, moradora de Araraquara, no interior de São Paulo, que afirmou à Justiça ter descoberto descontos de R$ 47 mensais da entidade, que é presidida por uma aposentada de Belo Horizonte, de 75 anos, que fatura mensalmente R$ 1,3 milhão e tem 23 mil associados.
Assim como Emília, mais de mil pessoas processaram a entidade. No caso dela, a RIAAM tentou provar que a aposentada era associada a uma ficha supostamente assinada por ela. Não deu certo. Uma perita nomeada pela Justiça atestou que a assinatura era falsa, o que deu ensejo a uma condenação da entidade.
No caso da RIAAM, a auditoria ouviu quatro pessoas e todas negaram ter autorizado o desconto.
Outra empresa dessa lista é a Confederação Nacional de Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (CONAFER) – 56 entrevistados disseram não ter autorizado os descontos na auditoria da CGU.
A entidade aumentou o valor descontado de aposentados em 57.000%, entre 2019 e 2023, segundo a CGU. O valor arrecado pela entidade saiu de R$ 350 mil para R$ 202 milhões.
A Polícia Federal (PF) aponta, em documentos da operação Sem Desconto, que um assessor do presidente da CONAFER é um dos operadores do esquema investigado por fazer a intermediação entre entidades e servidores do INSS. Cícero Marcelino, segundo a PF, é sócio do banco digital Terra Bank, que era usado para pagamentos da entidade.
De 27 pessoas entrevistadas sobre descontos pela Abapen, outra entidade, todas negaram a autorização. A empresa é ligada a Domingos Sávio, também vinculado à Unaspub, e que recebeu R$ 10 milhões de entidades que efetuavam descontos associativos. Ele também tinha procuração para atuar em nome delas. Segundo a PF, nos últimos anos, ele ampliou seu roteiro de viagens, que ficavam entre Brasília e Minas Gerais, para o Panamá e Miami (EUA).
Somadas, as empresas de Camisotti e de Domingos Sávio enviaram R$ 14 milhões ao “Careca do INSS”.
Além das entidades que tiveram 100% de entrevistados que negaram ter autorizado os descontos, outras que também não investigadas chegaram muito perto. É o caso da Master Prev (98 entrevistados, 97 negaram autorização dos descontos) e ABCB (64 entrevistados, 62 casos irregulares).